As bem-aventuranças os que sofrem perseguição

Felizes e abençoados são aqueles que sofrem perseguição e são objeto de zombaria e calúnia?

Bem-aventurados os que sofrem perseguição por causa da justiça, porque deles é o reino dos céus.”
(Mateus 5:10)

Felizes e abençoados são aqueles que sofrem perseguição e são objeto de zombaria e calúnia.

Posso imaginar as dúvidas que lhe vêm à mente ao ler isso, todas elas muito naturais. Pois, que sentido pode ter esse paradoxo quando colocado ao lado dos sete anteriores (vv. 3-9)? Deixe-me fazer-lhe algumas perguntas ao longo do texto, e chegaremos juntos a algumas conclusões.

O que significa “bem-aventurado”?

Como sugeri, é sinônimo de “feliz, abençoado e afortunado”. O termo grego é makarios, que de acordo com a concordância de  Strong significa “altamente abençoado”. Não se apresse a pensar que Jesus esteja falando de uma felicidade externa e temporal, tal como a que o mundo conhece. Ele fala de algo que não pode ser comprado nem com o mundo inteiro.

Embora as pessoas busquem intensamente dinheiro, prestígio, sucesso ou reconhecimento, a angústia mais aguda do ser humano reside em um nível muito mais profundo, onde nenhum estímulo externo pode chegar, onde o deleite e o sucesso se tornam repugnantes. Milhões de pessoas, pobres e ricas, iletradas e profissionais, caminham por este planeta submersos no desespero e no vazio. Temem o fracasso e a rejeição. Temem o desconhecido e a imponente eternidade que se aproxima. Como se isso não bastasse, há uma semente de eternidade no coração de cada pessoa (Eclesiastes 3:11) que a impede de relaxar, impede-a de acreditar que é apenas uma espécie animal ou o resultado de incontáveis acidentes ao longo de milhões de anos. E quando essas inquietudes surgem, a angústia se apodera da pessoa. Por outro lado, é também nesse momento que a bem-aventurança de Jesus torna a pessoa “altamente abençoada”.

Aquele que encontrou respostas satisfatórias para as perguntas pungentes que sua alma formulava, e encontrou a direção que o coração buscava avidamente, é verdadeiramente bem-aventurado. “Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo que, segundo a sua grande misericórdia, nos gerou de novo para uma viva esperança” (1 Pedro 1:3).

A bem-aventurança divina tem características únicas; toca tanto a alma como o espírito e tem sabor de eternidade. Mas para quem é a bem-aventurança?

Aqueles que sofrem perseguição

Aqui o Senhor se refere a um tipo especial de perseguição. Não é resultado de conflitos políticos ou de guerra por interesses econômicos. Jesus disse que ela é “por causa da justiça”. Mais adiante veremos com mais detalhes o que é a justiça. Por enquanto, vejamos o comentário que o próprio Jesus faz sobre a perseguição: “Bem-aventurados sois vós, quando vos injuriarem e perseguirem e, mentindo, disserem todo o mal contra vós por minha causa. Exultai e alegrai-vos, porque é grande o vosso galardão nos céus; porque assim perseguiram os profetas que foram antes de vós” (Mateus 5:11-12).

A perseguição pode tomar a forma de assédio físico, difamação, zombaria e calúnia. Entretanto, está claro que o discípulo de Cristo não é merecedor das afrontas que recebe, ainda que algo em seu interior incite o ódio e a inimizade de muitos na sociedade. Pensemos em Estêvão.

Ele era um homem cheio de fé e do Espírito Santo, cheio de graça e poder (Atos 6:5, 8). Observemos o que aconteceu depois que ele repreendeu seus perseguidores por causa da dureza de coração deles: “E, ouvindo eles isto, enfureciam-se em seus corações, e rangiam os dentes contra ele. Mas ele, estando cheio do Espírito Santo, fixando os olhos no céu, viu a glória de Deus, e Jesus, que estava à direita de Deus; e disse: Eis que vejo os céus abertos, e o Filho do homem, que está em pé à mão direita de Deus. Mas eles gritaram com grande voz, taparam os seus ouvidos, e arremeteram unânimes contra ele. E, expulsando-o da cidade, o apedrejavam. E as testemunhas depuseram as suas capas aos pés de um jovem chamado Saulo” (vv. 54-58).

Creio que nenhum leitor consegue encontrar nas palavras de Estêvão algo que o tornasse merecedor de tanto ódio. Nesse caso, qual a razão para as pessoas taparem os ouvidos e gritarem a fim de abafar as palavras de um homem acossado? Qual seria a razão para as pessoas atacarem com tanto ódio um homem indefeso? Enquanto Estevão contemplava a glória de Deus e seu rosto irradiava alegria e paz, as belas palavras que proferia penetravam nos ouvidos da multidão como um zunido metálico.

Desde os tempos antigos, os governos e os poderes religiosos se uniram contra os seguidores de Cristo para bani-los, persegui-los, difamá-los e até exterminá-los. Milhares de discípulos de Jesus foram mortos queimados, afogados, torturados, decapitados, devorados por feras ou abandonados em masmorras úmidas.

Hoje em dia, muitos “profissionais” ou pessoas em posição de autoridade dominam sobre aqueles que consideram fracos, inferiores ou necessitados. Em muitos casos, o cristão humilde torna-se vítima desses orgulhosos e arrogantes “predadores”. Como sinal de frustração e impotência, muitas pessoas da “alta sociedade” atropelam o seguidor de Cristo. Por que fazem isso?

Por causa da justiça

Quando a Bíblia fala de “justiça”, como nesta passagem, refere-se a uma retidão, equidade ou integridade de origem divina. Por esse termo, a Bíblia se refere a todo um conjunto de princípios e valores estabelecidos pelo próprio Deus. É a regra que impera no Reino dos Céus. É também o conjunto de verdades relativas a Deus e a seus santos e perfeitos desígnios. Por exemplo: quando andamos na vontade de Deus, andamos em justiça: “Porque assim nos convém cumprir toda a justiça” (Mateus 3:15). Em certa ocasião Paulo falou ao governador Félix “da justiça, e da temperança, e do juízo vindouro” (Atos 24:25). E o texto relata que aquele homem importante teve medo quando ouviu as verdades solenes sobre a justiça de Deus.

É necessário afirmar também uma verdade importante: somente a pessoa justa sofre por causa da justiça. Embora as pessoas sofram por várias causas, apenas a pessoa justa sofre por causa da justiça. O justo torna-se a evidência tangível de uma justiça suprema e de um Juiz justo. Somente Estêvão viu a glória de Deus, mas a paz e a serenidade com que enfrentou a morte indicavam com vigor que ele estava às portas de algo glorioso. E é isso que provoca a perseguição. O terrível remorso daquele que é confrontado com a verdade de sua condição perdida e miserável pode desencadear uma série de ações violentas e vergonhosas.

O seguidor de Cristo, aquele que anda em justiça, lembra as pessoas do que já suspeitam fortemente: que existe um Deus Criador e que ele estabelece as regras do jogo. Nesse caso, essas pessoas estão em péssimas condições para enfrentar a morte e para se apresentarem perante o Criador. “Como eu vivo, diz o Senhor, que todo o joelho se dobrará a mim, e toda a língua confessará a Deus” (Romanos 14:11). Eles gostariam de acreditar que o darwinismo explica a origem do homem e que o humanismo é o melhor guia para viver no presente; então, aparece uma pessoa que tem a coragem de viver uma vida reta e diferente. Desse modo é que o justo se torna um incômodo, pois se torna um aguilhão que lembra a sociedade de sua condição perdida e vazia.

Como se isso não bastasse, parece inaceitável para a sociedade que pessoas simples vivam de modo confiante, como se tivessem um conhecimento supremo ou ainda uma âncora no porvir. Mas é exatamente isso o que acontece! “Mas Deus escolheu as coisas loucas deste mundo para confundir as sábias; e Deus escolheu as coisas fracas deste mundo para confundir as fortes” (1 Coríntios 1:27). “Para que (…) tenhamos a firme consolação, nós, os que pomos o nosso refúgio em reter a esperança proposta; a qual temos como âncora da alma, segura e firme” (Hebreus 6:18-19). “(…) Cristo em vós, esperança da glória” (Colossenses 1:27).

Mas se os justos são objetos de perseguição, por que são bem-aventurados?

Porque deles é o Reino dos Céus

Eu creio que Jesus simplesmente seguiu a sequência lógica quando anunciou o galardão. No Reino dos Céus, impera a justiça de Deus, e somente os justos padecem por causa da justiça. Portanto, o lugar de cada justo se encontra no Reino dos Céus. Se isso não é uma felicidade suprema, o que mais pode ser?

Quando é marginalizado pela sociedade, o justo se lembra que existe um Reino no qual ele se encaixa perfeitamente. Se você enfrenta perseguição, é porque sua identificação com Cristo é evidente: “Todos os que piamente querem viver em Cristo Jesus padecerão perseguições” (2 Timóteo 3:12). Se goza de grande aceitação no mundo, é porque sua identificação foi pervertida e você está no nível de um falso profeta: “Ai de vós quando todos os homens de vós disserem bem, porque assim faziam (…) aos falsos profetas” (Lucas 6:26). Portanto, não hesite em beber o cálice de Cristo, o cálice do sofrimento, e garanta seu lugar no Reino dos Céus.

Como vimos no início, as pessoas hoje vivem sem esperança. Elas estão correndo para a eternidade como aqueles que correm na escuridão em direção a um abismo. Para viver no presente, a sociedade concordou em acreditar numa mentira: que o sucesso e o dinheiro trazem felicidade. Para enfrentar o futuro… Bem, os homens preferem não pensar no futuro — é muito desconfortável. No entanto, o justo, embora sofra por causa da justiça, caminha confiante pela vida. A sociedade descarrega sua frustração sobre ele, mas ele se compadece dela e continua seu caminho. O sofrimento só aumenta seu desejo por algo melhor. “Porque a nossa leve e momentânea tribulação produz para nós um peso eterno de glória mui excelente” (2 Coríntios 4:17). O homem justo pensa na promessa gloriosa e sorri. Ele sabe que o Reino dos Céus é dele, ele sabe que é bem-aventurado.

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